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Centro de Defesa questiona Governo do MA sobre atendimento socioeducativo
24 de julho de 2013
ASCOM CRESS/MA

CDMP_160x135siteEm carta aberta a ONG criticou as declarações feitas pelo Secretário de Segurança Pública, Aluísio Mendes, durante entrevista a uma rádio local e pediu o cumprimento do ECA e do SINASE. Há um ano, a única unidade de internação de adolescentes infratores foi interditada pelo Ministério Público por insalubridade.

O Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente Pe. Marcos divulgou na tarde de hoje uma carta aberta endereçada ao Secretário de Segurança Pública, Aluísio Mendes. O documento contrapõe as declarações feitas pelo Secretário sobre o ECA e a atos infracionais envolvendo adolescentes, durante entrevista a uma rádio local, e questiona a intervenção do Governo do Estado no trato do atendimento socioeducativo. A ONG lembra que o Estado já foi acionado até judicialmente, mas “transfere sua responsabilidade para outros”.

Leia abaixo a íntegra da Carta.

CARTA ABERTA AO SECRETÁRIO ESTADUAL DE SEGURANÇA PÚBLICA DO MARANHÃO

EXCELENTÍSSIMO SENHOR ALUÍSIO MENDES

Considerando as declarações acerca do Estatuto da Criança e do Adolescente proferidas pelo Secretário Estadual de Segurança Pública do Maranhão, Aluísio Mendes, durante entrevista à Rádio Mirante AM, na última quinta-feira (18), quando tentava explicar o aumento do número de assaltos a ônibus na capital maranhense, o Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente Padre Marcos Passerini vem se manifestar:

Lamentamos o pronunciamento do Secretário Estadual. Contudo, infelizmente, as palavras apenas confirmam a postura do Governo Estadual no trato das questões do atendimento socioeducativo: a mera transferência para “outro” da RESPONSABILIDADE que lhe é própria.

O ECA é fruto de um amplo debate, local, nacional e internacional. Seu ponto forte, inclusive, vem da própria Constituição Federal de 1988, nossa Carta Magna. Trata-se da doutrina da proteção integral, cujo teor do artigo 227 transcrevemos:

“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. 

Esse texto constitucional é ainda referendado pelo artigo 5º da Carta. Portanto, agredir o ECA é desprezar uma luta histórica que procura dar a crianças e adolescentes o direito de se desenvolverem e de se tornarem adultos cidadãos, estejam eles nos bairros de elite ou na periferia; na capital ou no interior do Estado; sejam filhos e filhas de políticos ou de domésticas. Todas as crianças e adolescentes são iguais perante a Lei.

É o ECA a lei que trata da violência sexual contra crianças e adolescentes; que trata do direito à convivência familiar e comunitária; que normatiza sobre a família substituta, guarda e adoção; que normatiza a profissionalização dos adolescentes e trata do combate ao trabalho infantil; que dispõe sobre viagens, impondo barreiras para o tráfico de crianças.  Imagine, Secretário, que foi necessário um lei para garantir a crianças e adolescentes o direito de brincar (ECA, artigo 16, inciso IV)!

E, claro, o ECA legisla sobre a responsabilização dos adolescentes que cometem ato infracional. Ao adolescente infrator a lei prevê sanções – que podem ser desde a advertência, passando por reparação de danos até à privação da liberdade – bem como a possibilidade do procedimento judicial. Além do ECA, há também a Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012, que trata especificamente do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE).

É, portanto, uma falácia difundir que o ECA é responsável pelo aumento da criminalidade. O aumento dos delitos juvenis acompanham o crescimento da violência, na cidade e no campo. Na recente pesquisa “Mapa da Violência 2013: mortes matadas por armas de fogo” os dados do Maranhão são tenebrosos. Um dos dados aponta o crescimento de 344, 6% na mortalidade por armas de fogo no Estado, no período de 2000/2010. “Entre os jovens, o crescimento da mortalidade por armas de fogo foi mais intenso ainda. Se no conjunto da população os números cresceram 346,5% ao longo do período, entre os jovens esse crescimento foi de 414,0%”, diz a pesquisa.

Agora, vamos aos fatos: tal como a Lei de Responsabilidade Fiscal ou a Lei da Ficha Limpa, o ECA precisa sair do papel. O legislador fez a sua parte. Cabe agora ao Poder Executivo – do qual a Secretaria de Estado de Segurança Pública e o Governo do Maranhão são instâncias integrantes, respondendo pela esfera estadual – cumprir as determinações do ECA e do SINASE para que a responsabilização dos adolescentes infratores ocorra como deva ser.

Não podemos deixar nossos jovens à própria sorte. Ou é o legado de morte que deixaremos para nossa juventude? Se considerarmos a oferta e a qualidade de saúde, trabalho, lazer, cultura, esporte e educação direcionadas à população juvenil de nosso Estado estamos longe de garantir que tanto potencial seja canalizado para desenvolvimento de nossos meninos e meninas e de nosso Maranhão.

Embora não justifique, esses indicadores explicam a negação de direitos a que estão submetidos meninos e meninos que estão na criminalidade. Pesquisas locais dão conta que há adolescentes que estão cumprindo medidas socioeducativas no Maranhão, que entraram na Unidade de Atendimento sem o documento de identidade! Como dizer que ele/ela era um cidadão/cidadã se o registro básico não há? Contudo, estamos prontos pra trancafiá-lo num espaço que não lhe dá condições de ressocialização. É assim que cumprimos o papel de algozes da nossa juventude sob o pretexto da punição pelo ato infracional.

Então, Secretário, não se trata apenas de prender. A responsabilização do adolescente precisa acontecer e deve ser feita conforme determina o SINASE. Sobre isso, o Governo do Maranhão já foi diversas vezes notificado e até condenado judicialmente, como na Ação Civil Pública que nós do CDMP movemos há seis anos, e pela intervenção do Ministério Público Estadual, que desativou há um ano a única unidade de internação existente no Estado devido às condições insalubres, tanto para os adolescentes quanto para os funcionários. A propósito, essa intervenção do Ministério Público exigiu a retirada imediata dos adolescentes, mas até o mês de abril deste ano ainda tínhamos adolescentes naquela Unidade. Resumindo, hoje, 24 de julho de 2013 completa um ano que o Estado do Maranhão não dispõe de Unidade de Internação para o atendimento socioeducativo de adolescentes infratores. Veja, portanto, que é preciso cumprir a Lei – o ECA e o SINASE.

No mais, nós do Centro de Defesa Pe. Marcos Passerini estamos à disposição para conversarmos sobe esse assunto. Receba-nos para discutirmos as políticas públicas para área da infância que vão desde às medidas socioeducativas, já citadas acima, como também pela estruturação da Delegacia da Criança e Adolescente, do Centro Integrado de Atendimento ao Adolescente Infrator e do Centro de Perícias Técnicas para a Criança e o Adolescente (cujos laudos estão demorando meses para sair), além das ações de enfrentamento ao trabalho infantil entre outras.

 

São Luís, 24 de julho de 2013.

Maria Ribeiro da Conceição

Coordenadora Geral

(original assinado)

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