FONTE: CFESS
Convidada especial do Conselho Pleno do CFESS de março, a professora falou sobre a conjuntura, pandemia e trabalho da categoria.
A professora Marilda Iamamoto durante o Pleno do CFESS.
A reunião do Conselho Pleno do CFESS de março inaugurou uma série de debates sobre a conjuntura e desafios para a profissão no contexto atual, momento privilegiado para análises que orientam conselheiras e assessorias nas suas decisões políticas e administrativas sobre as ações do Conselho Federal.
Realizado entre os dias 18 e 20, em formato on-line, o Pleno teve a honra de receber como convidada especial a professora Marilda Iamamoto, uma grande referência do Serviço Social brasileiro.
Vinculada ao Programa de Pós-graduação em Serviço Social na UERJ e em isolamento social na cidade de Juiz de Fora (MG), Marilda palestrou por quase uma hora e meia na manhã de sábado (20), sobre a conjuntura do Brasil e do mundo, a pandemia e os impactos na profissão, mostrando a vitalidade com que segue como uma importante pesquisadora do Serviço Social.
O convite à professora revelou-se muito pertinente, não só pela qualidade do debate, mas também pelo momento assertivo: as comissões do CFESS estiveram debruçadas na delimitação das ações prioritárias para o ano de 2021, com base no Plano de Metas, aprovado em dezembro de 2020, e nas deliberações construídas na Plenária Nacional, realizada no ano passado.
E uma parte significativa do conteúdo que Marilda Iamamoto apresentou vai na mesma direção dos esforços que o Conjunto CFESS-CRESS tem empreendido para manter compromissos e espaços de luta, mesmo durante a pandemia.
Para a professora Marilda, “em tempos de aridez de projetos de futuro, afirmamos a radical aposta humana na construção da história nos moldes da grande política. Vivemos tempos sombrios, num cenário ultraliberal, reacionário, potencializado pela pandemia mundial. E nesse contexto adverso é que a resistência é mais necessária”, destacando que “o Serviço Social assumiu um ideário emancipatória histórico, herdeiro da luta mundial dos trabalhadores e trabalhadoras, calcado em valores que dignificam o gênero humano. E é nesse ideário emancipatório que está o ‘antídoto’ para enfrentar a alienação e exploração do trabalho”.
Iamamoto falou também da responsabilidade das universidades e entidades nacionais em fomentar o pensamento crítico na formação e no trabalho de assistentes sociais, para enfrentar esses “tempos difíceis, de obscurantismo e negação da ciência”. Como afirmou: “nosso desafio é cultivar nossa competência crítica, para além das necessidades do mercado e do capital, sendo politicamente sensíveis aos interesses e necessidades da classe trabalhadora, da qual somos parte; para isso, é fundamental articular razão crítica e história”, complementa.
Pandemia aprofundou um projeto destinado a manutenção do poder do capital
Ao traçar um panorama geral sobre a crise do capital, relembrou que a lógica financeira do regime de acumulação sobrevive pela “concentração de renda, super exploração do trabalho, do saque dos recursos naturais, do aumento das desigualdades, da pobreza e do desemprego”.
Reforçou também que países periféricos como o Brasil, alvos dos capitais especulativos e taxas de juros, sofrem com a desindustrialização, déficit na balança, endividamento interno e externo, resultando num ciclo onde as riquezas geradas pela classe trabalhadora são usurpadas para pagamento de juros de uma dívida que só aumenta, retirando investimentos nas políticas e direitos sociais.
Na lógica de privatizar os lucros e socializar os custos, o Brasil segue a cartilha de “um projeto de classe destinado a restaurar o poder do capital”.
Os resultados disso estão no cotidiano da categoria e de toda a classe trabalhadora: subemprego e radicalização das opressões e desigualdade; riquezas naturais mercantilizadas; assalto ao Estado; reforço do braço repressivo do Estado; e muitos outros.
Por isso, Iamamoto entende que a pandemia não é a única responsável pelo cenário desastroso que o país (e o mundo) vive hoje. “Estamos falando de um terreno já minado pela crise do capital”, completou.
“Rever o passado para retomar a práxis da resistência”
A provocação que Marilda Iamamoto fez ao Pleno se estende a toda a categoria. Para ela, entender as expressões da questão social na vida cotidiana dos sujeitos sempre foi uma particularidade do Serviço Social. E foi nos momentos mais duros, como nos anos 1970 e 1980, que emergiram experiências inovadoras, de resistência política e que fundaram as bases do projeto ético-político profissional, que fundamenta o trabalho da categoria há mais de quatro décadas. Arremata: “é preciso pensar pelo avesso”.
Nesse sentido, alertou para os problemas de uma recente retomada de tendências conservadoras que vêm surgindo em uma parcela da profissão, que busca resgatar como referência técnica práticas fundadas no serviço social estadunidense, supostamente neutro/apolítico. Para esse grupo, o Projeto ético-político do Serviço Social seria demasiadamente “politizado” e “ideologizado”.
Iamamoto chama a atenção: esse discurso não tem nada de apolítico, pelo contrário, aponta para uma direção conservadora, que retoma a profissão numa perspectiva que individualiza e responsabiliza o usuário ou usuária pela sua condição. E mais: tenta ocultar a ideologia da direita.
Por isso, a professora ressalta: “é preciso rever o passado para retomar a práxis da resistência. Para enfrentar essa tendência conservadora, é preciso se inspirar na efervescência teórico, política, crítica e metodológica que contribuiu para a virada do Serviço Social brasileiro e fundou o Projeto ético-político, que assistentes sociais carregam no seu cotidiano”.
Ela lembrou também que na atual conjuntura, a intencionalidade do Projeto ético-político profissional tem sido constantemente tensionada pelas inúmeras demandas e requisições institucionais, que restringem recursos e direitos.
Por lidar com essas demandas, as conselheiras perguntaram: qual o caminho? Questão que talvez toda a categoria se coloque cotidianamente.
Iamamoto aponta possibilidades: retomar a dimensão política e educativa do Serviço Social, uma profissão cuja prática crítica é também inspirada na educação de base; valorizar o trabalho cotidiano de profissionais, que lidam com uma imensa população usuária desprovida de qualquer direito.
Sintonia com as atividades em curso e planejadas
A partir das questões levantadas pelos/as participantes do Pleno, ficou nítida a sintonia da agenda do Conjunto CFESS-CRESS com os apontamento feitos pela professora Marilda Iamamoto.
No âmbito da Seguridade Social, a coordenadora Elaine Pelaez destacou: “nossa comissão tem debatido a questão da vacinação, da renda básica e auxílio emergencial como parte da estratégia para enfrentamento da pandemia. E Marilda foi ao cerne do problema, ao afirmar que a vacinação em massa, para todos os brasileiros e brasileiras, é fundamental para o compromisso assumido pelo Conjunto CFESS-CRESS desde sempre: a defesa da vida”. Na opinião da conselheira, outras análises de Marilda estão em absoluta sintonia, como a constatação de que a pandemia só aprofundou e acelerou um projeto de governo e do capital que visa o desmonte das políticas sociais e a intensificação da exploração de trabalhadores e trabalhadoras.
E quais os impactos disso no trabalho da categoria? A coordenadora da Comissão de Orientação e Fiscalização (COFI) também buscou na fala da Marilda aquilo que o Conjunto tem se proposto a fazer. “A professora Iamamoto destacou a necessidade de aprofundarmos nosso conhecimento sobre o perfil da nossa categoria profissional. E uma das nossas ações prioritárias será sistematizar os dados coletados pela pesquisa sobre o Perfil dos/as Assistentes Sociais, que ocorreu junto ao recadastramento nacional obrigatório, por meio da campanha Viva Sua Identidade (2016-2019). Assim, vamos construir incidências que possam atender as necessidades de nossa categoria e dos sujeitos coletivos sociais, que são os/as usuários/as do Serviço Social”, apontou Maria.
Em vários momentos de sua palestra, Marilda enfatizou o projeto emancipatório do Serviço Social, que se enlaça diretamente a questões no campo da ética. Por isso, a coordenadora da Comissão de Ética e Direitos Humanos (CEDH), Kelly Mellati, salientou, entre as grandes ações da Comissão, a proposta de ampliação da série do CFESS Assistentes Sociais no Combate ao Preconceito, com novos temas e outras linguagens de comunicação. “Essa e outras propostas reafirmam a centralidade da ética nas ações do Conjunto e suas interfaces com a Política Nacional de Fiscalização. Estamos falamos de defesa de acessibilidade, de aprimoramento e monitoramento de ações que envolvem denúncias, desagravos e processos éticos, de ampliação do nosso Ética em Movimento, tudo que contribua para reflexão e qualificação da categoria, que impactará na qualidade dos serviços prestados”, completou Kelly.
A aproximação com assistentes sociais por meio do diálogo e, principalmente, a ampliação do pensamento crítico no interior da categoria por meio de material de comunicação, como o CFESS Manifesta, foram alguns dos assuntos abordados pela professora Marilda com interface na Comunicação. Iamamoto ressaltou a importância do CFESS Manifesta e de outras publicações do Conselho que não só orientam, mas apontam a direção crítica do Conjunto. A coordenadora da Comissão de Comunicação, Emilly Marques, concordou. “Consideramos a diversidade do nosso Brasil e também da nossa categoria, que tem enfrentado vários dilemas no trabalho profissional cotidiano, alguns deles relacionados a violação do próprio direito à comunicação como direito humano, em meio à pandemia. Temos buscado novas linguagens e ferramentas para dialogar com as e os assistentes sociais. Lançaremos uma pesquisa este ano para aprimorarmos esse diálogo. Nossas estratégias para o próximo 15 de maio (Dia do/a Assistente Social) vão nesse caminho”, explicou Emilly.
As ideias trazidas pela Marilda também abarcaram a perspectiva administrativa do Conjunto, como apontou a coordenadora da Comissão Administrativo-Financeira do CFESS, Carla Pereira. “Quando a professora Marilda nos indagou sobre ‘qual cenário nos desafia?’, é válido destacar nossos esforços no sentido de preservar a vida dos/as trabalhadores/as e, ao mesmo tempo, assegurar o adequado funcionamento da entidade e de suas funções precípuas, cumprindo as exigências legais e regimentais. Por isso, destacamos nossas ações de aprimoramento das regulações e normas internas em prol do desenvolvimento de boas práticas de gestão, em especial a Lei de Acesso à Informação (LAI) e a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD); e na perspectiva de uma ação dialogada com as novas tecnologias de informação, para melhoria na qualidade do sistema de informação e do processo de emissão do documento profissional”, ressaltou.
Ter uma estrutura administrativo-financeira forte possibilita que o CFESS promova mais ações no sentido da qualificação e formação da categoria. Assim, a coordenadora da Comissão de Formação e Relações Internacionais, Ruth Bittencourt, destacou o trecho em que Marilda Iamamoto falou a importância da formação de assistentes sociais para atuar no campo da educação básica, a partir da aprovação da Lei 13.935/2019. E no âmbito das relações internacionais, Iamamoto apontou uma ação que já vem sendo priorizada pelo CFESS, que é o de buscar consolidar “a presença internacional do serviço social brasileiro em uma perspectiva internacionalista de organização de trabalhadores/as”, fortalecendo a concepção crítica da profissão, em especial, dos países latino-americanos.
Para a presidenta do CFESS, Elizabeth Borges, a presença da professora Marilda Iamamoto no Pleno foi extremamente positiva e revigorante, e retoma lições importantes sobre o Serviço Social. “Marilda enfatizou que assistentes sociais são muito especiais e representam uma profissão privilegiada porque detém dados, informações e condições para pensar o Brasil, e é daí que se pode construir um projeto ético-político na atualidade. Ela é um exemplo de quem valoriza e acredita na profissão e isto é o otimismo da vontade em ato”, elogiou.
Os destaques de trechos da fala da professora Marilda mostram o quanto foi oportuna a reflexão proposta e como “o planejamento de ações e atividades do CFESS se tornou prenhe de sentido histórico e teórico-político”, finalizou.
Confira abaixo um trecho da fala da professora Marilda
Veja a pauta do Pleno de Março
Conselho Regional de Serviço Social do Maranhão / CRESS-MA
Gestão "Nosso Nome é Resistência" – 2020/2023