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Alerta: pessoas com deficiência já vivem tipo de “isolamento social” há tempos
3 de julho de 2020
ASCOM CRESS/MA

 

FONTE: CFESS

 

Na série de entrevistas sobre o trabalho da categoria na pandemia, tema da vez é pessoas com deficiência. Conheça o Guia que contribui para aprofundar debate sobre assunto.

 

Imagem mostra assistente social negra com máscara de proteção e jaleco, dentro de um círculo. Fora dele, desenhos representando o coronavírus. Ao centro, o texto CFESS Entrevista: e quem trabalha com pessoas com deficiência?

(arte: Rafael Werkema/CFESS)

 

“A situação de isolamento social não é novidade para pessoas com deficiência aqui no Brasil. A grande maioria de nós vive em isolamento social cotidianamente, seja por não ter acessibilidade arquitetônica para nos deslocamentos e acesso a diversos espaços, seja por não haver acessibilidade comunicacional”.

 

O depoimento da assistente social do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), Mariana Hora, que também é conselheira do CRESS-PE, introduz o tema a ser debatido hoje na série CFESS Entrevista, que aborda o trabalho de assistentes sociais na linha de frente do combate à pandemia do coronavírus (covid-19).

 

Como é a atuação de assistentes sociais junto às pessoas com deficiência nesse contexto? E como assistentes sociais com deficiência têm enfrentado a pandemia?

 

Para ajudar a entender um pouco mais sobre esse trabalho e os desafios enfrentados, entrevistamos, além da Mariana, outras duas assistentes sociais: Daiane Mantoanelli, assessora técnica do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência de Blumenau (SC), é conselheira nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Conade) e integrante do NuCRESS/Médio Vale do Itajaí; e Priscila Rosa da Silva Neves, assistente social da Apae de Cuiabá (MT), coordenadora estadual de Trabalho, Emprego e Renda da Federação das Apae (MT) e presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência de Cuiabá.

 

Mas antes dos trechos das entrevistas, uma pausa para descrição da imagem que virá a seguir.

 

Mariana Hora tem pele morena, olhos levemente puxados, cabelos pretos ondulados na altura do pescoço. Aparece sorrindo, com seu rosto apoiado em uma das mãos. Durante a entrevista, informou que é surda.

 

Priscila Rosa Neves tem pele clara. O cabelo, liso e escorrido até o pescoço, é claro. Sorridente para foto, ela usa óculos com armações mais arredondadas e um batom quase vermelho.

 

Daiane Mantoanelli também informou que tem uma deficiência visual (baixa visão). Na foto, aparece sorrindo. Tem os cabelos cacheados pretos, nos ombros. É branca, usa um batom rosa claro e óculos de armação preta, retangulares.

 

Fim da descrição da imagem.

 

Se você leu até aqui e não entendeu por que descrevemos as entrevistadas, é pelo fato de que pessoas cegas lendo este texto ficariam sem saber como são as assistentes sociais.

 

A descrição das imagens é algo que auxilia na acessibilidade. No final do texto você vai entender melhor.

 

Imagem mostra fotografias das assistentes sociais entrevistadas

(Fotos das assistentes sociais entrevistadas: Mariana, Priscila e Daiane)

 

Omissão do Estado, falta de condições éticas e técnicas: possibilidades de atuação

A omissão do Estado e a falta de condições para o exercício profissional foram alguns dos desafios apontados nas falas das assistentes sociais.

 

“O Governo Federal não adotou protocolos de atenção prioritárias destinados às pessoas com deficiência, que não foram incluídas como grupo de risco ao contágio da covid-19, o que demonstra total omissão e negligência deste Governo perante esta parcela da população”, denuncia Daiane Montoanelli, assistente social de Blumenau (SC).

 

Ela destaca que a proteção das pessoas com deficiência está prevista na Lei Brasileira de Inclusão (13.146/2015), cujo um dos parágrafos coloca essas pessoas como vulneráveis em situações de risco, emergência ou estado de calamidade pública, devendo o poder público adotar medidas para sua proteção e segurança.

 

E, obviamente, essa omissão e descaso do Estado impactam também nos/as trabalhadores/as que estão na linha de frente no atendimento à população, como aponta Priscila Rosa Neves, de Cuiabá (MS).

 

“A situação que vivemos hoje (da pandemia) coloca para nós, assistentes sociais, demandas que muitas vezes não temos as condições necessárias para o desenvolvimento profissional.  A pandemia trouxe à tona mais uma vez a falta de estrutura que os/as profissionais de Serviço Social possuem, e, principalmente, o recurso financeiro limitado para auxiliar famílias que possuem o mínimo para sobreviverem”, afirma.

 

Segundo ela, a orientação a familiares é também um desafio, pois ainda que haja disponibilidade de tecnologia, ainda existem pessoas que não dominam as comunicações virtuais para receberem encaminhamentos e orientações via web. “A pandemia nos trouxe a proposta de podermos pensar e efetivar novas formas de atuação com pessoas com deficiência nos cuidados multiprofissionais em todas as áreas – saúde, assistência, lazer, cultura”, reforça. Entretanto, só faz sentido se as pessoas com deficiência e suas famílias tiverem acesso e conhecimento às novas tecnologias, à internet, dentre outras ferramentas.

 

Nessa linha, a opinião da assistente social Mariana Hora, assistente social de Recife (PE), aponta para possíveis formas de enfrentamento a essas barreiras.

 

“O principal desafio para colegas assistentes sociais é conhecer as particularidades e singularidades das pessoas com deficiência para além do senso comum e da hegemonia da perspectiva médica/patológica. A principal contribuição que podemos dar é a articulação rápida da rede para tentar buscar atenção e acesso dessas pessoas a diversos serviços essenciais e, principalmente, às orientações sobre a doença, os protocolos de prevenção e seus direitos”, explica Mariana.

 

Na análise de Daiane Mantoanelli, um outro desafio é o de divulgar informações e intensificar as lutas ao acesso das políticas públicas. Nesse sentido, ela reforça a defesa do Benefício da Prestação Continuada (BPC), que vem sendo duramente atacado, das cotas para mercado de trabalho, da educação, dentre outras ações afirmativas, por meio do protagonismo e ativismo das próprias pessoas com deficiência. Ela reforça também a participação de assistentes sociais nos espaços de controle social como outra ação de enfrentamento e resistência ao descaso e omissão do Estado brasileiro em relação à temática.

 

Particularidades do trabalho das assistentes sociais com deficiência

Ainda no bojo dos desafios para a categoria, é preciso fazer um recorte sobre as particularidades das assistentes sociais com deficiência. 

 

Para Mariana Hora, essas questões são ainda mais profundas. “Enfrentamos cotidianamente diversas barreiras, seja diretamente no local de trabalho ou no caminho para o trabalho. Há uma pluralidade imensa de desafios diante das condições individuais de cada profissional com deficiência e de seu ambiente de trabalho. No atual contexto da pandemia, algumas dessas barreiras se agravam e outras surgem, seja para aquelas/es que estejam em trabalho remoto, seja para as/os que estejam atuando presencialmente. Ser pessoa com deficiência não nos coloca diretamente no grupo de maior risco da covid-19, no entanto, algumas deficiências são acompanhadas por doenças e comorbidades que afetam seu sistema imunológico, e há, ainda, situações em que pessoas com deficiência necessitam de apoio material ou humano para realizar suas atividades, então, estamos sujeitas/os a grande risco de infecção pelo coronavírus”, relata Mariana.

 

Na opinião de Daiane Mantoanelli, é imprescindível destacar que assistentes sociais com deficiência não estão dissociados/as de um contexto social cuja inserção no trabalho se dá de uma forma cada vez mais perversa e cruel. Ou seja, relações de trabalho cada vez mais permeadas pela exploração, precarização, retirada de direitos trabalhistas e sociais, assédios, baixos salários, adoecimento, desvalorização da profissão, entre outros.

 

“Além destes agravantes, convivemos ainda com a ausência e /ou precariedade no acesso aos recursos de acessibilidade. Quando estes recursos nos são garantidos, possibilitam a realização de nossas atividades com maior autonomia, segurança, proteção e desenvolvimento de nossas potencialidades”, exemplifica.

 

Ela ainda salienta que compete às instituições empregadoras, ao Estado e à sociedade, a remoção das barreiras arquitetônicas, atitudinais, comunicacionais, urbanísticas, de linguagem, “as quais nos impedem e/ou restringem nossa participação nesta sociedade de forma a garantir nossa dignidade e cuidado como valor ético”.

 

Isolamento é barreira para o vírus, mas falta de acessibilidade dificulta proteção

Que o isolamento é uma das formas de diminuir a contaminação pelo coronavírus, todo mundo sabe.

 

Os depoimentos das assistentes sociais alertam para o significado desse isolamento para as pessoas que necessitam de atenção e cuidado especial. “A necessidade de permanecer dentro de casa e de evitar contato físico com pessoas de fora da residência traz vários desafios especialmente às pessoas com deficiência, que precisam de cuidadores/as para realizar atividades básicas, e àquelas que têm peculiaridades de comunicação e/ou de compreensão, como pessoas surdocegas e as pessoas com deficiência intelectual. Nessas situações as possibilidades de contágio se agravam nas camadas sociais de menor renda e que residem em áreas com menos serviços públicos”, explica Mariana Hora.

 

Ainda segundo a assistente social do TJPE, de forma geral, pessoas com deficiência visual, auditiva ou intelectual, têm dificuldades e peculiaridades de comunicação. E em uma situação de internação em hospital, muitas vezes, são familiares, cuidadores/as e intérpretes particulares que prestam assistência, fazendo a mediação comunicativa.

 

Nos protocolos da maioria dos hospitais, por exemplo, visitas e acompanhantes não estão sendo permitidas, o que impacta diretamente na atuação da equipe multiprofissional que atende na unidade hospitalar e ao/à próprio/a paciente.

 

“Vou dar dois exemplos hipotéticos: 1) paciente surdocego/a que se comunica por Libras tátil, vai ser preciso envolver profissionais de guia-interpretação (que geralmente não têm formação na área de saúde) dentro do ambiente hospitalar; 2) paciente internado/a é uma criança sem deficiência, no entanto seus pais são surdos e têm dificuldades com a língua portuguesa, precisam que receber notícias do/a filho/a por meio da Libras. Em ambas as situações é possível resolver as problemáticas derrubando as barreiras e garantindo a acessibilidade. Porém, sabemos que dificuldades de infraestrutura de falta de recursos e de toda a dinâmica do atendimento hospitalar em uma pandemia vão exigir esforços maiores de profissionais e gestores/as envolvidos/as no atendimento a essas pessoas. Por isso minha preocupação de que muitas pessoas com deficiência podem estar tendo seus direitos violados por negligência do poder público na acessibilidade de comunicação”, ressalta.

 

Priscila Rosa Neves aponta ainda para outras questões, como a segurança das pessoas com deficiência, que, muitas vezes são vítimas de violência sexual e/ou doméstica. “Estando em isolamento, convivem noite e dia com o agressor, sem ter a acolhida segura”. Ela também ressalta que a convivência entre familiares pode, em alguns casos, gerar conflitos, já que o cuidado requer atenção e demanda. E assistentes sociais acabam também intervindo nessas questões.

 

Guia Mulheres com Deficiência: Garantia de Direitos para Exercício da Cidadania

Lançado em maio deste ano pelo Coletivo Feminista Hellen Keller, o guia “Mulheres com Deficiência: Garantia de Direitos para Exercício da Cidadania” vem se tornando uma grande referência para se entender e debater a temática, com o recorte de gênero necessário. E, sem dúvida, é material pra ser usado no cotidiano de assistentes sociais, principalmente profissionais que atuam no atendimento a pessoas com deficiência.

 

Descrição da imagem. Fundo laranja, sobre um piso branco, 10 mulheres. Uma mulher negra, com cabelos vermelhos presos. Ela tem o braço direito até a altura do cotovelo.Uma mulher branca de cabelos laranjas levanta os braços. Uma mulher branca de cabelos curtos e muleta. Uma mulher branca de cabelos lisos e longos. Uma mulher negra de cabelo black e megafone. Uma mulher negra de cabelos cacheados, sentada em sua cadeira de rodas. Uma mulher branca de cabelos curtos vermelhos com um cão-guia. Uma mulher de pele clara, cabelos curtos vermelhos apoia-se em muletas canadenses, ela tem um encurtamento na perna direita.  Uma mulher, de pele clara, com nanismo, tem cabelos longos vermelhos, a mão direita está na cintura e a esquerda ao longo do corpo. Uma mulher loira que tem uma deficiência na cintura. Fim da descrição. (Arte: Paloma Barbosa dos Santos).

 

A publicação aborda o tema na perspectiva dos direitos humanos, reforça a importância da concepção do modelo social sobre a deficiência, resgata o histórico do movimento das pessoas com deficiência no Brasil e abre espaço para diferentes abordagens sobre mulheres com deficiências no campos da saúde, da educação, dos direitos sexuais e reprodutivos, da acessibilidade, da violência, do acesso à justiça e de muitos outros assuntos.

 

Todo o guia foi elaborado por mulheres com algum tipo de deficiência, da produção de textos à edição, ilustração e finalização. Várias categorias estiveram na elaboração da publicação, inclusive assistentes sociais.

 

“O guia se apresenta como um potencial instrumento de informação, transformação social, articulação e ação política para o exercício da cidadania de mulheres, sobretudo das mulheres com deficiência”, explica a assistente social Daiane Mantoanelli, que também integra o Coletivo Feminista Hellen Keller.

 

O Guia também alerta que discursos sobre meritocracia e “superação” reforçam uma sociedade desigual, apontando no socialismo uma perspectiva emancipatória da pessoa com deficiência e de toda a sociedade.

 

“É um material que serve de base para que as intervenções profissionais do Serviço Social, possam reconhecer e, sobretudo, combater o capacitismo. Este termo diz respeito a toda e qualquer forma de preconceito e discriminação que põe em xeque a capacidade da pessoa, em razão de sua deficiência.  A lógica do capacitismo está alicerçada na ideia de uma padronização e hierarquização de corpos funcionais, denominando como corponormatividade”, explica.

 

Faça o download do Guia Mulheres com Deficiência: Garantia de Direitos para Exercício da Cidadania

 

Recursos de acessibilidade

Ao longo dos últimos anos, o CFESS tem buscado tornar cada vez mais acessíveis os conteúdos e materiais que produz acerca do Serviço Social brasileiro.

 

O documento Diretrizes para Normativa Sobre Acessibilidade sintetiza as ações realizadas e aquelas que ainda devem ocorrer para ampliar o acesso das pessoas com deficiência no âmbito do Conjunto.

 

Algumas ações/ferramentas são de uso constante, como a acessibilidade do site, que utiliza tecnologia que o torna responsivo, ou seja, que pode ser acessado em qualquer dispositivo, inclusive celulares, e tem as principais funcionalidades/ferramentas de acessibilidade, como alto contraste, o tamanho das letras e a opção de navegação pelo teclado.

 

O site utiliza também os chamados textos alternativos (ou descrição da imagem ou #pracegover): imagens e fotos não costumam ser “lidas” por programas de leitura de tela. Assim, procuramos inserir em todas as imagens do site os chamados “textos alternativos”, que são descrições das imagens que podem ser lidas pelos programas de leitura de tela.

 

Além disso, o CFESS utiliza a ferramenta Rybená, que auxilia ao oferecer às pessoas com deficiência auditiva, com deficiências visuais, aos/às idosos/as e outros/as com necessidades especiais, a possibilidade do entendimento do conteúdo do site do CFESS, por meio das ferramentas capazes de traduzir textos do português para a Língua Brasileira de Sinais (Libras) e de converter português escrito para voz falada no Brasil.

 

Obviamente, o Rybená não substitui a intepretação de libras realizadas por seres humanos e traduz, em vários momentos, expressões e frases de uma forma mais literal.

 

Entretanto, tem auxiliado no acesso a todos os conteúdos textuais disponíveis no site do CFESS, inclusive livros em PDF.

 

O CFESS disponibiliza em todos os eventos gravados em vídeo a tradução em libras.

 

O Código de Ética do/a Assistente Social e a Lei de Regulamentação da Profissão (Lei 8.662/1993) foram disponibilizados em braile (cada CRESS tem uma cópia) e em audiolivro.

 

E, neste ano, foi lançado na Língua Brasileira de Sinais (Libras).

 

 

Conselho Regional de Serviço Social do Maranhão / CRESS-MA

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